sábado, 23 de agosto de 2008

Educação no Brasil


Na semana passada fiquei muito indignada ao ler a reportagem de capa da Revista Veja (Você sabe o que estão ensinado à ele, Prontos para o Século XIX e A Neutralidade como Dever) sobre a educação no Brasil. Embora tenhamos sim muitas coisas a repensar sobre a educação brasileira, a reportagem não é imparcial, colocando o ponto de vista dos cidadãos socialmente privilegiados. Dentre as coisas que mais me revoltaram em tal reportagem está a crítica a Paulo Freire, que é chamado de "personagem arcano sem contribuição efetiva à civilização ocidental, autor de um método de doutrinação esquerdista disfarçado de alfabetização". A reportagem critica duramente o fato de a maioria dos professores entrevistados (29%) identificar-se mais com Paulo Freire do que com Einstein (6%) segundo a Veja "talvez o maior gênio da história da humanidade". A revista ainda critica o fato de a maioria dos professores ter elencado formar cidadãos conscientes como uma das finalidades mais importantes da educação, acima de proporcionar conhecimentos básicos. A reportagem encerra dizendo que os professores não deveriam se envolver com a formação política: "Acho que a formação política de cada um é sua prerrogativa individual, sujeita apenas à interferência dos pais. Não é para ser condenada ou legitimada na escola. Mesmo que os pais não pratiquem sua prerrogativa, isso não dá ao professor o direito de se assenhorear da tarefa. Não acredito que a maioria dos professores brasileiros, com seu baixo preparo intelectual, tenha condições de oferecer ao aluno a exposição complexa e multifacetada que as questões inerentes à formação da cidadania exigem." - Pergunto: e os pais de nossos alunos da escola pública tem condições de oferecer esta exposição? Por isto eles devem permanecer sobre o jugo da dominação? Acho que é esta a "malvadez neoliberal" a que Freire se refere.
Para fazer o trabalho de ECS sobre o ser professor e suas implicações históricas, mas com estas inquietações é que fui ler Freire novamente (Pedagogia da Autonomia). Encontrei uma frase de Freire que penso que traduz exatamente ao mesmo tempo o que a Veja criticou e o que ela mesma fez:
"[sobre a luta a favor da ética] Na maneira como lidamos com os conteúdos que ensinamos, no modo como citamos autores de cuja obra discordamos ou com cuja obra concordamos. Não podemos basear nossa crítica a um autor na leitura feita por cima de uma ou outra de suas obras. Pior ainda, tendo lido apenas a crítica de quem só leu a contracapa de um de seus livros. Posso não aceitar a concepção pedagógica deste ou daquela autora e devo inclusive expôr aos alunos as razões por que me oponho a ela mas, o que não posso, na minha crítica é mentir. É dizer inverdades em torno deles." (FREIRE, 1996, p. 18)
Felizmente encontrei outros protestos de colegas professores quanto a esta preconceituosa reportagem.

2 comentários:

carem disse...

Olá colega...
Realmente é inaceitável os comentários relacionados a nossa profissão, mas é claro que em época de política eles não lembram de comentar o descaso das Políticas Eduacionais, nem dos contraditórios acertos do Estado em não cumprir com suas obrigações.
Temos que ter dó dessa revista que edita problemas que são de ordem governamental e não dos profissionais.
Abraços adorei seu blog!

Simone Bicca Charczuk disse...

Oi Jéssica, trazes um importante debate a tona e tua argumentação crítica à reportagem está muito bem construída. Além disso buscaste elementos em Freire não somente para elaborar a crítica mas também para pensares no trabalho proposto pela interdisciplina de ECS. Abração, Sibicca